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Os impactos da COVID-19 intensificados sobre a comunidade LGBTQIA+


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Primeiramente este aqui que vos escreve gostaria de explicitar meus recortes de privilégios e me colocar no local de fala de homem branco cisgênero que atende a maior parte das “exigências”/expectativas heteronormativas da sociedade. Mas porque alguém abre um texto desta natureza com esta informação?

Talvez valha a pena começar a explicação pela (re)apresentação do conceito de interseccionalidade. Esta é pensada como uma categorização teórica que focaliza múltiplos sistemas de opressão que agem sobre grupos de vulnerabilidade social, tais como o racismo, machismo, LGBTQIA+fobia e seus desdobramentos, capacitismo, etc. A interseccionalidade então evidencia que as diversas pessoas dentro da comunidade LGBTQIA+ podem sofrer com múltiplos sistemas de opressão diferentes que intensificam ainda mais a vulnerabilidade destes. Estes sistemas de opressão se instalam dentro da estrutura de exploração patriarcal-racista-capitalista constituindo um sistema de opressão-exploração.

Assim, cada um dos sistemas vulnerabiliza os indivíduos tendo como eixo central a questão de classe e os diversos desdobramentos que intensificam a agressividade sobre o indivíduo de acordo com o número de sistemas de opressão que você integra e quais são eles. Lembrando que, pra quem não se enquadra nos padrões cisgêneros heteronormativos, além da opressão familiar, em alguns casos as condições estruturais da sociedade o colocam em mais desigualdade, em especial no enfrentamento ao COVID-19. Isso fica evidente nas formas de exclusão da própria comunidade ao acesso ao mercado de trabalho para as pessoas transsexuais e transgêneras, muitas vezes abandonadas a própria sorte e relegadas à prostituição.


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Esta exclusão é um dos exemplos, a invisibilização e a padronização são outras formas de agressão e sempre duram no limite na capacidade de monetização do capital, afinal, se der pra lucrar com o preconceito serão preconceituosos, mas se der mais lucro associar-se à bandeira LGBTQIA+ é pra lá que eles vão. Na dúvida, tente ir a fundo e ver o quadro de funcionários e se as posições que ocupam nestas empresas respeita a diversidade como um todo, ou se ela foca no homem branco cisgênero heteronormativo preferencialmente.


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É importante ressaltar que, para muitos integrantes desta comunidade, a estrutura familiar exerceu durante a nossa formação como seres humanos um ambiente pouco saudável e muitas vezes nada subsidiador da formação psicológica sem traumas. E muitas famílias continuam exercendo este papel até hoje, logo, estar em quarentena, para muitos, é estar preso em um ambiente que te é agressivo, um ambiente com seus assediadores pertencentes à estrutura familiar. E ainda quanto mais longe do modelo/padrão idealizado, mais marcas tendem a ficar nas pessoas que estão fora deste molde.

Claro, pressupondo que todos têm casa e que nenhuma família condena seus membros LGBTQIA+ à rua e ao abandono afetivo. Nestes cenário, nós precisaríamos abrir um parênteses só pra discutir o cumprimento do artigo 1º, inciso III da Constituição Federal, que garante a dignidade da pessoa humana, e o artigo 7º, inciso IV, da mesma carta magna, que descreve as necessidades primordiais que o Estado deveria garantir a todas(os) trabalhadoras(es) e contempla entre eles o direito à moradia. Ambos os direitos são descritos como fundamentais para a constituição do Estado Democrático de Direito, entretanto, discorrer estes temas levariam por si só um texto cada um a parte de uma pessoa mais especializada nestes temas do que eu.



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De doença a conquista de (poucos e tardios) direitos

Hoje, 28 de junho, se comemora 51 anos da Revolta de Stonewall, um marco nesta dura escalada na busca de direitos represados. Já tive a oportunidade de escrever sobre esta data em outros textos neste blog, então vou tentar focar em outras questões desta vez para não parecer repetitivo.

No último 17 de maio completou-se 30 anos que a OMS (Organização Mundial de Saúde) retirou a homossexualidade da Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID). Para as pessoas transexuais apenas ano passado, em 25 de maio de 2019, que a transexualidade, até então doença mental, foi retirada desta lista e o CID continua a existir apenas com a finalidade que as pessoas consigam fazer a transição pelo sistema de saúde.

Os membros da comunidade LGBTQIA+ sofrem além de todos os tipos de violência citados, a ocultação da real causa da suas mortes, uma vez que os dados do governo são questionados pela comunidade internacional e por grupos de defesa dos diretos, como o GGB (Grupo Gay Bahia) e ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais). No mundo ainda se morre apenas por ser LGBTQIA+ e, apesar da sensível redução de assassinatos em 2019, os número de 2020 pré-COVID já apontavam um forte aumento de assinatos deste grupo de pessoas. Estes grupos e coletivos ainda tem lutado em muitos estados e municípios pela criação dos conselhos LGBTQIA+ e que estes sejam representativos para fiscalização e proposição de políticas públicas, o que tem acontecido de forma bem lenta pelo Brasil afora.

Outro exemplo se dá na equiparação da LGBTQIA+fobia ao crime de racismo apenas ano passado pelo STF (Supremo Tribunal Federal), o que seria, apesar de tardio, um grande avanço se não fosse o fato deste crime não ter um condenado até hoje, já que todos os casos foram tratados como injúria racial que coincidentemente tem a pena bem mais branda.

Ainda no campo dos direitos que estão tardiamente sendo reconhecidos, podemos destacar que a possibilidade de doação de sangue foi conquistada apenas há poucos dias. [Ironia] Nada mal para quem só teve a presença garantida no CENSO a partir de 2010. [/Ironia] Isso pode parecer pouco, mas durante o avanço que vivemos de neopentecostais fundamentalistas em todos os poderes da nação e na consequente perda (ou não avanço na conquista) de direitos, é uma vitória.

Este momento que vivemos é tenebroso para todos, mas acredito que tenha ficado claro, mesmo que de forma superficial e sem ouvir demais representantes das outras letras da sigla, como os poucos direitos conquistados e a vulnerabilidade pré-COVID intensificam a exposição da nossa comunidade LGBTQIA+ a este segundo genocídio promovido por Bolsonaro e Mourão. Entretanto, num momento deste que a garantia da vida deveria estar acima dos lucros, assistimos a um governo hostil a sua própria população, provocando genocídio e capaz de ser generoso apenas com o sistema financeiro e bancário.

Assim, acredito eu que não podemos defender quem nos tira direitos e legitima a violência contra nós, como Bolsonaro, tão pouco quem nos trata como moeda de troca, já que o kit para combater a LGBTQIA+fobia foi retirado de pauta na busca por apoio pelo governo Dilma.

Uma saída? Vamos de solidariedade e inclusão! De corpo, alma e coração, pois, sem a ampla defesa dos diversos integrantes da nossa comunidade dotados de recortes de vulnerabilidade hoje, não teremos forças suficientes amanhã para as lutas que nos aguardam no pós-COVID-19. E mesmo se tivermos, não valerá a pena chegar até lá perdendo a nossa pluralidade.



 
 
 

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